17 de janeiro de 2013

Um grito, um silêncio, um vazio.


 Este conto está participando
da edição visual do 

Desde que ela partiu, em meu coração ficou o silêncio, um vazio tão imenso quanto o universo. Conhecemo-nos numa manhã de sol ameno, em Maio de 1993. Faz muito tempo desde que a olhei pela primeira vez. Ela era aquele tipo de mulher que sabia o que queria, totalmente determinada.

Ela era detetive particular, usava sempre roupas meio masculinas, e apesar de ter no sorriso um lago transparente, o seu olhar estava sempre atento a tudo o que se passava ao seu redor. E eu era apenas um homem de meia idade, professor de literatura recém-aposentado. Vivia em meio a solidão, junto a uma bagunça de um amontoado de livros, revistas e jornais.

Quando ela bateu palmas em frente a minha casa, abri a porta e a encontrei na calçada. A princípio ela olhou tão séria para mim que senti certo receio, mas logo ela sorriu um pouco e disse que eu não precisava olhá-la com olhar surpreso, pois ela só queria me fazer algumas perguntas. Convidei-a para entrar. Logo aquela casa antes tão apagada acabara de ganhar brilho, até parecia que a brisa da manhã havia chegado junto com ela.

Ela estava investigando uma chacina que havia acontecido há algum tempo naquela casa. O assassino havia matado os pais e os dois irmãos de um jovem, e agora ele queria justiça. Fiquei pasmo, havia pouco mais de seis meses que eu estava morando naquela residência e ninguém nunca havia comentado sobre aquele fato trágico.

Os dias foram passando, e fomos ficando cada vez mais próximos. Todos os dias ela ia a minha casa a procura de vestígios do assassino, mas nada encontrava. Certa vez houve até um beijo meio roubado de minha parte. Mas, ela era tão profissional que preferiu não misturar as coisas.

Um dia, numa tarde qualquer, o meu telefone tocou. Ao atender, a voz grave do outro lado perguntou: “Quem está falando, é o professor Jerônimo?" “Sim”, respondi. “E a detetive Sara está com o senhor?" Novamente respondi que sim. E a voz masculina começou a nos ameaçar: “Se vocês não deixarem de investigar este crime, vocês não verão o sol na manhã seguinte." Ele continuou nos ameaçando. "Há poucos minutos estará chegando ai uma foto de vocês dois, esta é a prova que vocês estão na minha mira" . Depois disto o carrasco desligou na minha cara.

A foto chegou mesmo minutos depois. Isso me deixou assustado, mas Sara não recuou, parecia não temer a nada, e avisou a polícia. O delegado mandou dois soldados ficarem de vigia em frente a casa. Meu coração já tão vivido nunca havia sentido algo tão intenso. Lembro-me que senti um tremor no corpo inteiro, não era  só o medo de morrer, era medo de perder aquela mulher que mesmo não sendo minha havia tirado a terrível solidão de dentro de mim.

Quando a noite caiu, ouvimos tiros, vários tiros. E a sirene da polícia que até hoje ecoa dentro de mim. Agachamo-nos perto da poltrona. A casa parecia um campo de batalha.  Ouço um grito de dor, e no instante em que levanto o olhar vejo Sara toda ensanguentada, dando o último suspiro. Coloco-a em meus braços, e ela balbucia suas últimas palavras: “Je... eu queria ter ficado com você, mas eu precisava primeiro desvendar esse crime, por favor, me entenda! Eu te amo!" Então, ela deu um suspiro profundo e morreu em meus braços. Eu chorei desesperadamente como nunca havia chorado.

Depois, lembro apenas que a polícia entrou depressa, e disse que havia prendido o assassino. Mas, naquele momento isso pouco importava, ele havia tirado a vida da mulher que poderia me devolver à vontade de viver que eu perdera desde que fiquei viúvo. O que me restou foi a fotografia que ele tirou para nos ameaçar. Esta é a única fotografia que tenho dela.

Hoje, vinte anos depois, passo em frente a casa que a conheci e que a vi partindo. Seguro a foto nas mãos e tento trazer o passado para perto, colando as lembranças. Colo o sorriso dela, o meu olhar surpreso, e vejo por trás da imagem dois corações que poderiam ter se amado pelo resto de suas vidas, mas que o destino não permitiu. O único sonho realizado foi seu sonho de deteve, pois, ela conseguiu que aquele malvado fosse preso, mas em troca ela perdera a vida, e levou meus sonhos.

                                                                    Luzia Medeiros 



16 comentários:

  1. Triste mas muito lindo. A vida com suas surpresas.
    Bjo no coração.

    ResponderExcluir
  2. A via e as suas surpresas! Que bom foi ler aqui! Beijos!

    ResponderExcluir
  3. Olá!

    Tbm estou participando desse projeto e vim conhecer seu conto.
    Um pouco medonho.... que coisa!
    No meu também tem um morte, acho que a casa é realmente amaldiçoada. rsrs
    Gostei!

    Beijos

    ResponderExcluir
  4. Foi lindo. Há tempos não vejo um texto tão intenso. A verdade, é que muitas vezes me peguei pensando se deixei transparecer meus sentimentos para quem realmente deveria compreendê-los e hoje me vejo em uma encruzilhada, pois não sei se isso um dia se concretizará. O destino as vezes zomba de nós. Talvez nós devessemos viver com um pouco mais de intensidade, o problema é que nós nunca sabemos qual é a medida certa. Um ótimo conto Lu, despertou coisas aqui dentro que eu não queria que saísse.
    beijos

    ResponderExcluir
  5. Ficou lindo, me envolvi totalmente na história, simplesmente perfeito e super criativo. Uma pena que ela esperou até o ultimo momento para falar o que sentia para ele. ><

    ResponderExcluir
  6. Oi Luzia, que lindo, a vida tem dessas coisas né/
    Tenha um ótimo final de semana, beijos.

    ResponderExcluir
  7. Olá Luzia, é realmente um texto muito lindo, onde está por vezes presente a emoção, a tristeza..., mas bonito sem dúvida
    bj

    ResponderExcluir
  8. Puxa, Luzia, que história forte...acho que sendo verdade ou ficção, o amor verdadeiro deveria merecer sempre um final feliz. Bela participação, um abraço!

    ResponderExcluir
  9. Eu amei o conto,de verdade.Ficou clichê,mas a forma como escreveu pareceu uma história nunca escrita antes *_*
    Sério.Ficou lindo <3
    Eu amei seu blog aqui.Tu escreve muuuuuito bem *_*


    Beeijinhos
    http://borboletametamorfoseando.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  10. Parece a vida: esses altos e baixos onde o deslumbramento se confronta com o desespero. Uma perda superada por um encontro. Outra perda insuperável, quando a gente ama demasiado - e ainda mais platonicamente.
    É a vida.

    ResponderExcluir
  11. Luh, independente de tudo, voce sempre será para mim uma excelente escritora de contos!
    Minha número 1 *-*

    ResponderExcluir
  12. Que lindo! Adorei a História ^^ Que pena que já nao existem homens assim, sentimentais =/

    http://inspirationsbymeforyou.blogspot.com/

    Bjocas fofa =D

    ResponderExcluir
  13. Meu Deus, quase chorei aqui, haha. Muito demais, Luzia. Uma história triste, linda, encantadora, chocante e cortante, tudo ao mesmo tempo. Adorei, de verdade. Você escreve muito, muito bem(;
    Beijo♥

    http://menina-do-sol.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  14. Ain que lindo...me emocionei. Para mim vc é uma escritora completa..impossível não se envolver e viajar cm suas palavras. Amo cada post seu... Sou sua fã!

    xeruh flor

    ResponderExcluir
  15. Acho que o conto fala tudo. Eu gostei muito, nem sei o que comentar. Muito bom.

    Hipérboles
    @hiperbolismos

    ResponderExcluir
  16. Estou aqui hoje por um motivo mais que especial.
    Tenho que dizer que não foi fácil conseguir você para ser meu seguidor,
    foi muita motivação impulsionando com postagens e visitas...que atingi 300 seguidores
    Agradeço te convidando a visitar a florada do IPÊ junto comigo no FOLHAS DE OUTONO !
    Deixo o meu abraço recheado de carinho !!!!!

    ResponderExcluir

Espresse aqui o que você achou das minhas palavras. Espalhem um pouco do seu carinho.